Os entraves para mulheres na jornada rumo ao Conselho Administrativo

Programa Conselheiras 101 incentiva a presença de mulheres negras em conselhos de administração e mostra os caminhos até lá.

Esta semana, tive a oportunidade de ministrar uma aula no IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) para as mulheres que integram o Conselheiras 101, um programa de incentivo à presença de mulheres negras em conselhos de administração.
Criado por um coletivo de mulheres, e com apoio da KPMG e da WCD (Women Corporate Directors Foundation), o programa chega
com o objetivo de ampliar o conhecimento de executivas em relação aos desafios da jornada de uma conselheira de administração.
A oportunidade foi incrível. Conversar sobre o tema de diversidade e inclusão com mulheres negras líderes, brilhantes e que estão
fazendo a diferença no Brasil em relação ao racismo estrutural e ao machismo introjetado, é um desafio e uma honra. Para você
que me acompanha aqui na coluna Diversifique-se, eu não poderia deixar de trazer os caminhos desta conversa!

O primeiro dilema que vivenciei foi sobre o pouco tempo que teria com essas mulheres! Afinal, três horas de aula, em uma sala com
cerca de 30 mulheres, na qual a jornada e a fala de cada uma dá um TED Talk de altíssima qualidade, por si só, já é um presente e
eu não poderia abrir mão desse momento.

Por isso, embora eu soubesse que a apresentação reduziria o tempo expositivo da minha aula, fiz questão de propor um momento 360° na qual cada uma delas estaria, desde o minuto um, conduzindo a aula comigo. Carla Lopes de Moraes, diretora de E-commerce na Avon, Chantal Pillet, diretora de Compliance do Grupo Carrefour, Flavia Lisboa Porto, diretora de RH na Yara Brasil, Jandaraci Araujo, Chief Financial Officer na 99jobs, Mafoane Odara, líder de Recursos Humanos e Conselheira Administrativa na Meta, Monalisa Gomes, diretora Executiva da Edmond Tech, Monica Marcondes, executiva de Investimento no Santander, Roberta Anchieta, superintendente de Administração Fiduciária no Itaú Unibanco, Vania Neves, Chief Technology Officer da Vale, Viviane Elias Moreira, Chief Process & Innovation Officer na 99jobs, são algumas das mulheres que integram o Conselheira 101 e que abrilhantaram a aula. “A gente sempre está. Nunca é. Não importa o seu cargo, a sua visibilidade. Você sempre será uma pessoa negra, não importa o saldo bancário, cargo. Por exemplo, se você vai a um shopping center no qual o padrão de renda dos consumidores é elevado, e é negro, já te olham torto”, esse foi o comentário da renomada executiva negra, Jandaraci Araujo, ressaltando como pessoas negras estão sempre sujeitas ao racismo estrutural, bastando mudar o contexto, por exemplo, ir a um bairro ou shopping considerado nobre ou tradicional, no qual as pessoas não te conhecem, para a negritude virar padrão de exclusão.

“Quando chegamos, toda a nossa ancestralidade chega conosco. É fundamental lembrar sempre de onde viemos para definir aonde
vamos”, disse Monalisa Gomes. “É preciso ter coragem”, sinalizou Carla Moraes, trazendo a sobreposição de situações e desafios com os quais lidamos no dia a dia. Mulher negra. Executiva negra. “De onde vem a coragem?”. Por fim, nossas inquietações são as mesmas de muitos executivos, questionou Mafoane Odara já no primeiro momento da aula. “Qual o ponto de virada? Quando e como vamos realmente ver toda essa conversa de diversidade e inclusão trazendo uma mudança prática para a sociedade?”. Para mim, o ponto de virada é sempre a gestão, principalmente no contexto do mundo empresarial. Não é preciso descobrir nenhuma grande novidade, mas sim trazer o aprendizado que tivemos em algumas das maiores empresas do mundo, nos mais variados segmentos, para construir e fazer diversidade e inclusão na prática. Qual o diagnóstico? Qual o benchmarking? Qual o cenário do país? E com base nestas informações, bem como das especificidades dos negócios, traduzir em um planejamento com metas e indicadores, de curto, médio e longo prazo, os objetivos da empresa e concretizá-los, com uma equipe bem preparada e um orçamento condizente com os desafios e com os anseios.

Por fim, como disse Viviane Elias, “sororidade é fundamental. Não se gera essa transformação sem que nós mulheres negras atuemos de forma a sempre propiciar espaços para que mais e mais mulheres negras estejam nestes espaços de tomada de
decisão, vocalização, atuação”. E, como eu sempre digo, acrescento que é preciso responsabilidade. Pessoas brancas precisam entender qual a sua responsabilidade neste contexto de transformação social, qual a sua responsabilidade na construção de uma sociedade mais justa. E sim, isso passa por renunciar a privilégios estruturais, estabelecidos historicamente. Ou seja, você que é uma pessoa branca e está lendo este artigo, não lutou para ter esses privilégios, não queria ter esses privilégios, talvez nem ache justo
tê-los, mas, cotidianamente, usufrui deles. E é preciso ter essa consciência e dizer: Basta! Eu quero igualdade! Eu quero equidade!
E esse movimento começa agora por mim!

*Liliane Rocha é CEO e fundadora da Gestão Kairós, consultoria especializada em Sustentabilidade e Diversidade, autora do livro Como ser um líder Inclusivo e premiada com o 101 Top Global Diversity and Inclusion Leaders

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